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Enquanto dormia um país em luto pela tragédia que matou 71 pessoas e dizimou a equipe da Chapecoense na madrugada da ultima terça-feira, a Câmara dos Deputados virou as costas aos dois milhões de brasileiros que votaram em favor das dez medidas contra a corrupção apresentadas pelo Ministério Público – e desfigurou o texto de modo que a única mudança substancial aprovada foi a que torna crime o caixa dois. Foi o último ato de um jogo de cena que teve início assim que o projeto de lei chegou ao Congresso, em março. Os parlamentares jamais cogitaram aprovar o texto do MP. Mas não ousaram deixar transparecer a intenção para a opinião pública.
Diante do conturbado momento da política nacional, os deputados preferiram deixar que a tramitação do texto seguisse sem maiores interferências: a ideia era aprovar o projeto na comissão criada para analisá-lo e, então, mudar o teor dos principais pontos em plenário. A comissão ouviu promotores e juízes. Também aprovou o texto elaborado pelo relator da matéria, o deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS). Houve chiadeira, mas não grandes duelos. Os parlamentares sabiam que a batalha principal se daria em plenário. Multipartidária, a manobra se deu por meio de emendas apresentadas por nove legendas. O texto segue agora para o Senado – e nada indique que tenha melhor sorte por lá.
No início da votação, por volta das 21 horas, caciques partidários ventilavam pelo Congresso que estava por vir uma grande mudança no texto final. A comoção nacional provocada pela tragédia da Chapecoense deu aos parlamentares a chance de fazer uma alteração ainda maior do que eles próprios previam originalmente. Mas ainda era muito cedo para que a manobra fosse posta em prática. Reuniões na calada da noite baixavam o quórum e preparavam o que estava por vir. Assim que o texto-base foi aprovado, deu-se a chuva de emendas, cuja votação só se encerrou pouco depois das 4 horas.
Além de desconfigurar as medidas propostas pelo MP, os parlamentares aproveitaram o sono dos brasileiros para mandar um recado de intimidação aos procuradores: a primeira mudança aprovada foi a inclusão no pacote da previsão de punir por crime de abuso de autoridade magistrados, procuradores e promotores. “Está sendo aprovada a lei da intimidação contra promotores, juízes e grandes investigações”, disse no Twitter o chefe da força-tarefa da Lava Jato, Deltan Dallagnol. A emenda obteve o apoio de 313 deputados – muitos deles, enrolados no petrolão.
Os deputados também incluíram a possibilidade de punir policiais, magistrados e integrantes do MP de todas as instâncias que violarem o direito ou prerrogativas de advogados. A emenda foi patrocinada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e apresentada pelo deputado Carlos Marun (PMDB-MS). “O objetivo inicial do pacote era combater a impunidade, mas isso não vai acontecer porque as principais ferramentas foram afastadas. O combate à corrupção vai ficar fragilizado e, com um agravante, que foi a essa intimidação dos investigadores”, disse Lorenzoni, isolado dentro do próprio partido. Nem o DEM ficou a favor do texto elaborado pelo deputado. Lorenzoni foi vaiado e hostilizado por seus pares.
*** Informações com matéria completa na Revista Veja

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