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Assistente social de 35 anos, que pediu para não ter o nome revelado, é exemplo do medo das mulheres em denunciar estupros. Ela relata como foi violentada pelo próprio parceiro em 2005. Ele a forçou a uma relação sem preservativo, até então item obrigatório para o casal. Moradora da zona norte, a assistente engravidou e depois fez aborto. Doze mulheres são estupradas por dia no Estado do Rio, diz o dado oficial. Eu cursava o segundo período de serviço social e, em 2005, fiz um trabalho para a faculdade sobre a implementação da lei Maria da Penha. Havia feito uma entrevista associada ao tema do meu estudo naquele dia e, depois, fui encontrar uma pessoa com quem me relacionava. Não era meu namorado, mas nos víamos e fazíamos sexo com certa frequência.
Fomos a um motel. Só que desta vez, seu comportamento foi diferente. Ele optou por subir em cima de mim, me segurou pelo pescoço e, sem usar preservativo, forçou a relação sexual. Só me soltou depois que ejaculou.
Perguntei por que ele havia feito aquilo. Disse simplesmente que sentiu vontade. Falei que ele não tinha o direito, que não era para ser assim. Mencionei o risco de gravidez porque estava no meu período fértil.
Fiquei desorientada, sem saber o que fazer. Não consegui voltar para casa. Ao sair dali, ainda de madrugada, a primeira coisa que procurei foi uma farmácia que estivesse aberta. Comprei uma pílula do dia seguinte, mas infelizmente não adiantou.
Houve fecundação. Fiquei grávida, e não estava nos meus planos ter uma criança naquele momento. Decidi que ia fazer um aborto. Procurei uma clínica clandestina, tomei o remédio indicado pelo médico e voltei para casa. Não contei nada para a minha família. Naquela época, ainda morava com meus pais.
Esperei por quase 12 horas, sentindo dores e contrações, até expelir o feto no banheiro de casa. Me olhava no espelho e não acreditava que aquilo estava acontecendo comigo. Eu tinha feito um aborto. O procedimento foi em um sábado e já fui trabalhar na segunda para não despertar suspeitas. Foi muito difícil. Sangrei por 32 dias.
Minha vontade era denunciá-lo, mas não registrei o caso na polícia. Tive muita vergonha. O que eu iria dizer na delegacia? 'Acabei de sair do motel com o cara que costumava transar e fui estuprada?' Se não há preparo hoje para lidar com este tipo de situação, imagine dez anos atrás. Poucas semanas depois, ele me procurou novamente. Ao saber do aborto, disse que queria dividir as despesas do procedimento, mas me recusei a aceitar. Neste encontro, ele chegou a encostar a mão no meu braço e me afastei rápido, uma reação brusca. Ele ficou surpreso e me perguntou o que estava acontecendo. Disse que nunca mais queria chegar perto dele. Foi uma conversa muito difícil, eu chorei muito. Ele se sensibilizou com meu sofrimento, mas em nenhum momento identificou aquilo como um abuso. Tenho absoluta certeza de que, ainda hoje, ele não reconhece que aquilo que fez foi um estupro.
*****Folha Uol

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